Com_traste

Com_traste

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Frágeis



As palavras estão tão gastas
Que receio quebrar a crosta fina que as sustenta
Mal lhe toco agora
Olho-as desejando tocar-lhe como antes
Não me atrevo a assumir nas minhas mãos o seu ultimo momento
Nem na minha boca o seu ultimo suspiro
Fomos cruéis com elas
Ao ponto de as deixar assim fragilizadas
Queremos-lhes tanto…ou tão pouco
Que esquecemos de cuidar delas
Violamos-lhe a origem
A sua pura casta
E depois vestimo-las de histórias
De memórias
De fantasias
Sentimentos
Inventos
Desejos
Egoístas e cegos
Manipuladores
Descrentes
E agora quase a ficar mudos
Seremos igualmente surdos
E cegos
Conta-me uma história
Pedimos…
Não fosse ter manchadas as mãos
A língua morta
Nem pesada a consciência
Contaríamos como outrora
E assumiríamos a culpa de nada soar como antes
Quando as palavras eram virgens nas nossas bocas
E a sua verdade era única
Todo o encantamento se quebra agora
Mal lhe toquemos com a ponta dos dedos
Ou com a ponta da língua
O que resta
É um sabor a ausência do valor das palavras
É acto de amor pago à prostituta
É paladar de algodão que já fora doce
Restos
De papeis assinados à mão
Ou marcados com impressões digitais
Vivas.
Agora
Morrem-nos
Nos dedos nus
Sem papel
Sem laçarotes nem rendas
Decalcadas de boca em boca
Não fosse ter receio de quebrar a sua crosta fina
Diria ainda…tanta coisa que ficou por escrever.

Sem comentários:

Enviar um comentário