Com_traste

Com_traste

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

grito do Ipiranga



Atada de pés e mãos
Sentia a voz aos saltos na garganta
O grito a lutar contra as paredes do seu pudor
Ou com dor
Voaria então dentro dela
Aguentando até mais não conseguir
Mas testava-se
E os limites eram apenas imposições dos outros
Ela nunca se impôs a si
Mas agora queria saber se aguentava
Esperar o já não poder mais
O momento certo
Que rodava na roleta da sorte
E se acertasse que faria?
Contorcia o corpo
Em prazeres selvagens
Salivava, sem querer molhar-se mais ainda
Mas era já um lago de fluidos
Até às lágrimas chegavam os seus sentidos
E sem mais demoras
Solta para fora
A voz do gozo
Do acto de se libertar
Agora só precisava de prender o coração!

CamaLeão



Mudava de cor
De forma
De expressão
Ora um doce
Ora amarga até mais não
Na cama dormia
Outras vezes rugia
Devorando a presa que com ela se deitava
Na rua passava pé ante pé
Na praça voava
Nem sempre a viam com clareza
Reflexos da sabedoria
Do animal disfarçado
Se por vezes apanhado
Ela mudava a pele de cobra
E a cor dos olhos iludia
Agora
Fera mansa
Ou mulher fria
Amanhã
Tomando o trono da selva
Amando até ser dia
Cama
Leão
Mãe
Cria

ReviraVoltas


De que lado fica a frente de nós
Quando conseguimos rodar em voltas completas
Sobre nós mesmos?
Encarar de frente a vida
Num mundo que gira sem darmos permissão
Confunde as faces da moeda que deitamos ao ar
Ao mesmo tempo que troca o céu pelo chão
Invertemos o quadro
E o surreal do abstracto só muda a posição das coisas
O sorriso da Mona Lisa não deixaria de ser daquela cor
E o preço a pagar custaria igualmente os olhos da cara
Caso não os tivéssemos muitas vezes na nuca
As repetições são exaustivas
E optamos muitas vezes por cantarolar apenas a musica dos mesmos poemas de amor
A sombra não deixa de ser um reflexo
E de noite precisamos de luz para que não nos temam
Vultos ao virar da esquina
Que afinal podem ser apenas a nossa sombra
Rodopiamos na mão cantarolando infantilidades
Para parar o crescimento obrigatório
Dolorosas dilatações de corpo e alma
O nexo que não faz sentido algum
E tu que nunca és quem queria
E eu que não me consigo encontrar de olhos nos olhos comigo
Para!
E no grito de ordem desobedecemos ao comando
Continuando numa roda viva
Como se fosse peça dentada
Sem conseguir morder
Mas que na corrente faz girar a máquina
Sendo muitas vezes sanguínea a substância doada
No corte da carne que se pesa na balança
Para picar depois
Devagar
Sadicamente
Até que alguém nos consiga ver de frente
E sorrindo diga:
Mais uma volta de carrossel ?
E seguimos escolhendo o cavalo alado
Para na junção dos bichos nos voltarmos a confundir
E perder a noção da posição dos corpos
Esperando que ao acordar
Sejamos um nó(s) cego
Até que se consiga desatar …e ver.



Imagem :Georgy Kurasov







segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Entrelaçados


Conheciam aquela parte que cada um inventava do outro
Mas conheciam-se bem
Há muito que ela estendia os seus braços em silencio
E ele retribuía em silencio com dois braços também
O tempo era ausências de espaços de tempo
E de lugares
Mas quando os braços um do outro se estendiam para o único espaço que tinham comum
Não tinha passado tempo algum
Nem existiam lugares ainda descobertos como tal
E ali
Nesse lugar inexistente, inconsciente e fora de lógicas
Acontecia o abraço que sabiam seu
Há muito tempo
Naquele lugar
Iriam ficar assim…agora!

A inexistência das coisas...


As coisas que pensamos ver são invisíveis
E os nossos olhos criam apenas ilusões
A tua voz
É apenas o acto único da junção de sons
A que dou o toque magico do encantamento
Quando assim te quero
As pedras
São pássaros cansados de voar
Que se deixam pisar apenas para que ninguém os obrigue a voar para longe
As portas não são mais que entradas e saídas em simultâneo
Poderiam ser simples janelas, mas resolvemos complicar
As palavras são sentimentos subjectivos
Mesmo quando nomeiam objectos
A coisa
É sempre inexistente
Até ao momento em que a resolvo pensar
As semelhanças entre as nossas coisas
Está apenas no medo da loucura
E por isso resolvemos concordar
O que escrevo não é o que quis dizer
O que lês não é o que escrevi
Se desenhares um pássaro
Ele não voa
Tenta desenhar apenas o céu
Eu poderei ver as asas do pássaro que me querias mostrar

sábado, 14 de janeiro de 2012

Bichinhooooooooooooooooooo

O bicho que atiças
Acorda
E agora?
Estendes a corda
Ou deixas-te trincar?


O bicho selvagem ruge
Quando nela surge a vontade de caçar
E quer que lutes
Mesmo quando te queres deixar matar
Morde-te devagarinho
Assim de fininho
Só para te ver sangrar
E chama-te
Num grito aflito
Apenas para disfarçar
Alisa-te o pêlo
Parecendo mimar
Mas quando te acamas
Ela surge outra
E ataca antes que possas escapar
Lambe-te a ferida
Como fêmea querida
E aperta-te a nuca
Deixando a dor te entrar
No meio do acto
Toma-te inteiro de uma vez só
E antes que possas assumir derrota
No momento da estucada final
Dá-te a honra do grito mortal
Em gozo mutuo
Acordando a selva inteira adormecida
E ela desiste de te matar



No inicio era o verbo...SER

Abrem-se em mim todos os poros
Por onde me purifico
Nas noites brancas
Claras
Lúcidas
Depois dos dias negros
Escuros
Confusos
Como cubo de gelo a liquidificar
Depois de se perder numa boca quente
Abrem-se em mim todas as portas
Como hipóteses de concretizar na felicidade da escolha
Consciente
Livre
Arriscada
Minha!
Como o vento que não encontra oposição
Para derrubar muros
Ou um corpo
Que se completa num outro
Abrem-se em mim a minha alma ausente
Como milagre que ofusca o racional
Luminosa
Confiante
Eufórica
Como se fosse possível aguentar todas as dores
Por já as saber de cor
E seguir em frente sorrindo
Abre-se em mim o meu nome
Em letras Maiúsculas
Com orgulho do nome que me faz única
Independente
Mulher
Louca
Guerreira
Abre-se em mim o despudor
E agora
Mordo os lábios apenas por prazer
E no meu corpo de bicho fêmea
Uivo à lua
E vou SER

Vice-versa

Não fechar a porta
Ou deixar acontecer
Aquela que também sei ser
Pedaços de mim por ai
Entrelaçados com os nadas
Mas tão possíveis nadas como outros
Cobre-se o chão de maçãs tentadoras
E morde-se uma a uma
Salivas
Sentado na cama
Enquanto me alimento do pecado
E degustas a imagem que pintas
Escolhes a musica com o cuidado de quem escolhe uma mulher para a vida
Enches os copos de líquidos distintos
E nas diferenças da cor
Imaginas os beijos possíveis a combinar
Contrastando o quente e frio
O tinto e o verde
O meu e o teu
Ergues-me num gesto de dança lento
E nesse encosto
Já nem penso
E enrolas-me os cabelos na mão
Puxas noutra direcção
Trocamos os copos
Os beijos
O fumo que cheira a sonhos
E no fim…
Deitas-me na cama de frutos proibidos
Para que se eternize o momento

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

Falta?



Falta muito para chegar a primavera?
Tenho saudades das andorinhas a cortar o céu
E das papoilas a pintar campos
E malmequeres…
Das tardes amenas em que os dias se estendem…por ai
Aquela sensação de que é possível só mais um pouco…de dia
E à noite…sair sem rumo
Sem medo do frio ou da chuva
E se chover…molhar o rosto e sorrir nos olhos
Aqueles passeios de mãos nos bolsos
Sem receio de virar a esquina
Olhar pela primeira vez a rua onde passamos todos os dias
E dizer boa noite a desconhecidos
E desconhecidos responderem com voz conhecida
Olhar a lua mesmo que ela se tenha escondido
E sentar num jardim e olhar o espaço onde amanhã vai nascer uma flor
Falta muito?
Ela disse que voltava
Eles dizem que ela volta sempre
E eu acreditei
Falta?

Em-canto

Entra
Não te sentes
Olha-me
Agora enquanto me dispo
Ausente
Toco-me
Olho-te
Entra
Com-sinto
Com-sentes
Não te sentes
Olha-me
Olho-te
Entras-me
Quente
Em-canto
Onde me colas
E não mentes
Entra
Olha-me
Sinto-te
Sentes-me
Encantada
Encaixada
Grito
Gemes
Chamas-me
Confirmo Queres-me
Quero-te
Entra
Não te sentes

e.com/watch?v=NAFW8KQbNVc&...

Im-Pulsos


Nos pulsos que pulsa a minha e tua vida
Em saltos
Altos
Finos
Batendo já sem ritmo adequado ao passo
Dão-se ao corte
Antes da morte
Para que escorram vida
Como orgasmos coloridos
Molhando o chão de negro sangue
Com que me pintas o rosto
Depois
E nos dois lados
Opostos
Misturam-se vontades similares
Para conTrastar com a face invisível do traste
O Yin Yang numa luta
Em prisões de gozo
Os que se dão à morte agora
Jubilam vaidosos
Olhando-se nos espelhos dos olhos
Enquanto se tenta o outro para a imobilidade
Colocando pulseiras iguais
Não te mexas agora
Mas anda…

A-Corda

A-Corda

Que ata
Que mata
Que enlaça no ato
Que puxo
Que puxas
Que rompe em quatro
A corda
Que lhe dás
A corda com que me soltas
Que desata
Que desaperta
Que desenlaça
Que largo e largas
E nesse acordo em desacordo
Acordo

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

(para) Com-Trastar

Iluminou-se o negro pensamento
Ou aceitou o fim da história inacabada no coração
Mão no corrimão
Pé no chão
E sobe a escada que leva ao alçapão
No escuro da noite acendeu a luz
E na parede lisa escalou ao cimo
Fixando no tecto o seu máximo de tolerância à dor
Na mesa da cozinha deixou a lista das coisas desnecessárias
E fez as contas ao custo da vida que se leva se não sorrir
E em prantos afogou a agua que gota a gota saia do frigorifico
O gelo quente parece gente a fazer-se em pedaço
Abre a porta do quarto
E faz a cama para dormir desfazendo a que fizera para sonhar
Mas resiste
E pega na insónia e chama-lhe meu amor
Num acto de violação consentida
Faz-se morta em vida
Quando os traste resolve arrumar
E contando pelos dedos
Todos os segredos que é suposto não contar
Pinta as unhas de incolor verniz
Para quem diz que diz
Poder roer sem sequer mastigar
No fim mete a viola no saco
Vai dar banho ao cão
E coça os macacos do sotão
Esquecendo estar no alçapão
Atira-se da janela do 3º esquerdo
Caindo em frente da própria porta
Da rua da imaginário, nº impar, piso único e escorregadio
Ao ver a barbaridade
Encolhes os ombros e bate à porta
Pergunta com voz morta
Quem raio ali quer entrar
Responde com voz de em-cantar
O fado da desgraçadinha
Sou eu
A própria
E a porta abre-se sozinha

Aluada


Hoje a lua não veio à mesma hora
Para lhe deitar a escada e subir até ao cimo
Ali
Onde se acamam todas as fantasias
E adormecem todas as criaturas intranquilas
Ficar assim a olhar para o céu
Com uma única imagem na íris
Torna impossível ver estrelas
E é tudo apenas breu
Mas ela não veio hoje
À hora que sabe que a espero
Não sei ainda se lembra como a quero
Não sei se não vem apenas porque se perdeu
E agora que faço eu?
Espero mais umas horas
Talvez eu nem tenha a noção do tempo
E a qualquer momento a lua aparece para me levar
Sim, mais um pouco
Esperar assim não incomoda
Silenciosamente na noite
Me quedo
Fecho os olhos
E acalmo a inquietação
Se não olhar o vazio
Ele não existe
E dentro dos meus olhos adormeço
Durante o tempo certo
O tempo que leva de uma noite a outra noite
De dessa noite a outra noite
Até que me apaixone pelo dia

Vestígios





Não era na gola da camisa que se notava
Ela passava a língua sem deixar borrão
Nem era o perfume que deixava
Sabia-se ficar na memoria
Tão pouco as marcas das suas unhas a denunciavam
Deixava os vincos por debaixo da pele
Mas era nos seu próprios lábios que se condenava
Por deixar beijos eternos
Em manchas da cor do desejo
Apagados beijos ao se morder

Em Desfolhada




Ela deixou-se ficar eterna flor
No leito onde se enquadrava na perfeição
Quer ali como no chão
Ela enraizara
E em gotas de orvalho se alimentou
O tempo eterno é enorme
E toda a flor morre um pouco depois da primavera
E ela
Musa antes deleitada
Sente a brisa fria dos dias das naturezas mortas
E desfolhada ficou

em flor


Ama-me agora
Disse a musa ao pintor
E ele desnudando a que sempre para ele estava nua
Pinta-lhe o corpo em flor
Com pétalas de rosa rubra
Ensanguentadas pelo ventre que sempre penetrou
Em carne viva
Quente
Nos seu dedos desfeita
E ela ausente de movimentos
Deixa-se inverter completamente
E o seu dentro sai fora
Naquela hora
Ela nasce flor
Para em pólen se eternizar
Num quadro assinado pelo autor

Morte súbita


Morte súbita
Será pena do condenado
Escrita em carta de amor como um ultimo legado
De nada valerá matar aos pouco
Eternizar a condição
A morte tem a mesma dor
O fim é o sempre anunciado
Nos intervalos do tempo em que se perde a noção da vida
Se olharmos com atenção
Ela paira sobre nós
Jogando como criança às escondidas
E ai de nós quando teimamos em pensar que não
Ai a condenação será trocar o amor
Por uma eterna mancha negra ao nosso lado
E a sombra não é a da que chamamos morte certa
A sombra é a nossa própria incerteza da vida
E caso comprem um caixão
Para evitar gostos alheios duvidosos
Ousem ser originais
E façam do próprio corpo o ataúde
E cavem a cova com a mão
Levantando do chão o morto que antes de nós se sepulte
E ai sim há reencarnação
Podendo ser comprovada a teoria da imortalidade
Dos amantes que nascem condenados a serem apenas a sombra um do outro…

Crónicas Marcianas


Ela já não se mexia
Estava com declaração de morte emocional
Ligadas às máquinas há algum tempo
Os cientistas contabilizavam os custos da manutenção daquela “coisa”
Mas por imposição da lei de Afrodite
Enquanto houvesse uma pequena memória
Que fizesse suspirar o ser
Ninguém poderia ousar desligar a criatura
Custasse o que custasse!
E a máquina lá ia mantendo o sinal vital
Em ziguezagues nada constantes
Fazia curvas em forma de coração
Rectas como flechas
Pontos de exclamação
Finalizando com pontos de interrogação
Mas nunca pontos finais…
Um certo dia
Quando a criatura assim vivia
A máquina deu sinal de alguma coisa anormal
Fizeram-se teste
Chamaram-se cientistas do mundo inteiro
E à volta da “coisa”
Sentenciaram a conclusão
A Coisa perdeu a razão!
E se já estava com morte emocional
Perder agora mais fosse o que fosse
Só poderia ser bom sinal…
A coisa…foi-se!
Mas enquanto discutiam ouviu-se um som esquisito
E sem a máquina dar por isso
Os ziguezagues pararam
E começam a surgir bolhas
Círculos em vários tamanhos
E ainda mais estranho
O som do bater do coração parecia uma melodia
Desliguem o rádio!
Gritou um cientista mais distraído
Mas depois de todos os botões em off
O som continuava
Era um som liquido
Bem definido
Pediram novos exames
E analises de todo o género
E foi ao verem uma ecografia
Que a Coisa se confirmou
A Coisa alem de teimar em respirar
Tinha-se auto fecundado
E em breve nasceria uma Coisa qualquer de dentro dela
O que originou alem de alegria
A morte da Coisa como antes era
Foi-lhe dado alta médica
Com requisição de alguns cuidados a ter
Para não mais se perder
Bastaria deixar viver a Coisa nova que surgia
E duas colheres de sensatez
Quer de noite quer de dia
Um exame à consciência
Sempre que esta pesasse
E Nunca
Mas nunca Mais
Se auto medicasse
Nada de exageros
Nada de grandes impulsos
Se caísse no mesmo erro poderia ser fatal
E a Coisa assim se ergueu
Dando à luz um novo ser
Mas ninguém sabe bem ao certo
Que raio de Coisa irá nascer…

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Por uma unha Negra


E eu perco-me tentando inventar a cor, a forma, o sentimento
E em desespero invento
Solto a tinta pelo corpo dentro
Salivo o roxo meio confuso querendo ficar preso aos lábios
Sai contrafeito porque eu insisto
Sopro um lilás desmaiado
Mas não soa a beijo
Parece pouco
E se eu comesse a cor?
Se a mordesse até sangrar?
E nesse gesto de dor
Nada surge ou acontece
E eu já sem pudor
Dispo-me do sangue que me veste
E ali, num de repente
Surgem beijos encarnados
Descobri uma outra arte
Nem me parece diferente
Mas é muito mais quente
Viva e colorida
É como a vida
Que surge na união
Da boca que saliva
E a unha negra que investe

sábado, 7 de janeiro de 2012

Éter


A paixão
É uma coisa grande
Enorme
Que nos enche e ainda consegue sair de nós
De tão grande por vezes rebenta em amor
E fica-se assim a pairar
Sem querer abrir os olhos
Mesmo sabendo-nos em pedaços por ai...

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

Bicho


Sou um bicho
De conto
E quer por medo ou timidez
Enrolo-me em mim de vez
E faço-me de conta
Que conto
Em era uma vez…
Sou um bicho
Do mato
E mato a fera em mim
Morro de parto
Que de garras afiadas no meu ventre
Esgravata o que sente
E desse sangue se alimenta
Sou um bicho
Da madeira
E em fabrica de sonhos se desfaz
Roendo agora o que antes foi
Destrói para construir depois
Ou tanto faz…
Sou um bicho
Quase humano
Cada vez que nisso Penso
Talvez seja um desengano
O bicho que diz que pensa


Imagem: photomanipulation by Svetlana Bobrova

Até que amor os separe ...upss morte! Amen


Agora prendia-te à cama
E entre ais e uis
Faria tudo outra vez
Que me acusassem de violação
Alegaria perturbação
E caso fosse condenada
Daria os pulsos sorrindo
Mas que posso eu fazer senão matar-te?
Ali naquele leito como ninho
E depois de amar-te
Numa dentada tragar-te
E lentamente chupar os restos teus
Depois
Louva a Deus
Na hora da morte
E esperar o perdão
Mesmo sem ter salvação
Num outro qualquer paraíso

(imagem: by Andrey Belle)

De fa©to




Comprovado
Mais que visto e explicado
Alisado alguns pormenores
Para que a peça fique justa ao pretendido
Algo mal alinhavado não cairia tão bem
Eu sei que o fato convêm
Por ser feito com paixão
E ao senti-lo
Olhando para todos os defeitos
Não me perco nos botões
Que casam na perfeição
Sinto é aquele frio
De quem fica meio despido
Mas para que tudo tenha sentido
Veste-se o facto no fato
E o fato no sem abrigo

Imagem: Stunning surreal photo manipulations by Simon Siwak

Gravidade


O grave, das palavras agudas
É que quando são ditas ferem-nos como alfinetes
Estes, supostamente de dama
Não usam tabuleiro para fintar o parceiro
Nem depende do sexo a dor da perda
A gravidade é ludibriada
Usando pedras nas algibeiras
Para que deixemos a cabeça sobre os ombros
E na lua apenas fiquem os nossos olhos
Esses, esvaziam-se
Em mares e marés
Ou em partos
Quando rebentam as aguas
Porque é sempre ao fim das nove luas
E a coisa assim aparece mais lógica
Ao mundo
Enquanto continuamos, aparentemente, assentes neste ponto
Podemos levitar dentro de nós
Porque no vazio
Só o eco escreve o que dizemos
E na repetição…pode ser que nos consigamos convencer
Que o grave
Está na gravidade
De uma gravidez “utopica”
E abortemos com base na lei do homem
Todo o amor que nos enche agora de vácuo
Balões de ar
Como sussurrados beijos
E palavras ditas nos olhos
Em voz de alfinete
Picando o ventre
Que sangra
E o orgasmo surge
Como fim de um crime premeditado
A vitima em estado grave de morte
Será indemnizada com tudo aquilo que viveu

(imagem: Mystery of shadows, photo manipulation by Natalia Naka Adamska)

Despistes



Fora de mão
O carro que sem luzes segue estrada fora
E lá dentro
A pistola que disparava sem balas no canhão
Gera-se a confusão
E faz-se pisca para a direita com o pé no travão
Sem direcção acende-se a mesma canção
No cinzeiro toca um cigarro
Mudanças em numero desnecessário
Olha-se mais uma vez o reflexo
E o espelho franze o sobrolho
Nesse ar ameaçador
Reduz-se a velocidade
Chama-se nomes ao condutor
Que no lugar do morto nos guia
Pede-se um GPS
Sai um mapa amarrotado
Do mesmo sitio das multas
Só com um ponto marcado
Estando quase a chegar
Salta da ponte um leão
Ah, afinal era um cão
Continua-se a circular
Paragem nada obrigatória
Mas aceitamos dar boleia
Senta-se no banco traseiro
Um amigo imaginário
Fala no conto do vigário
E de dentes amarelos sorrimos de outra cor
Já é depois do sol pôr
E nem vivalma se avista
Gritaria terra à vista
Se o carro fosse a vapor
Repetindo pensamentos
Muda o som do coração
Um estrondo
Pé no travão
Soa um grito ou um lamento
Ah, era o vento
Disse o amigo na risada
Abre a mala e tira a faca
Pedindo a pedra de amolar
Na mão um naco de carne
Acabado de matar
Recusamos a oferta
Fumamos outra canção
Soletramos letra a letra
Abre-se o vidro do carro
O vento recusa entrar
Seguimos desnorteados
Rumo a nada
Coisa nenhuma
Excesso de velocidade
E o carro quase a parar
Sem pressa queremos chegar
E antes que fiquemos loucos
Deixamo-nos agarrar
Pela névoa da estrada
E já sem se ver mais nada
Alguém sai sem eu parar
Ao longe um candeeiro
Contra nós vem a andar
E sem mão na direcção
Faz-se as curvas conhecidas
Mais um choque sem cadeia
E um corpo inanimado
Siga
Diz o policia fantasma
A via verde sorri
Insisto pagar portagem
E o carro que acedem a luz
O morto que nos conduz
Diz numa voz encantadora
Chegámos
e
truzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz
Para a próxima sou eu quem conduz!

(imagem: Stunning visions of Kassandra)

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Em...Cantada


O tanto querer
Dá voz ao canto lírico
Do pássaro imaginário que nos possui
A imagem que hipnotiza os nossos olhos
Aparece receptiva ao chamamento
E somo-nos comandados
Encurtando distâncias
Com os beijos sonhados
Na mascara que cobre o rosto de nós mesmos
Pantomima realista
Da fatalidade do amor
Conseguimos saber de cor
Os gestos do ser amado
Sorrimos encantados
Felizes e enternecidos
Poemas concretizados
Amor falado
Amor cantado
À marioneta sem sentidos…

imagem: photomanipulation by Svetlana Bobrova

Com...Partes


O ventre
Quente e húmido
Gere e digere o gozo
Em transformações visíveis do exterior
No acto em que o invisível protótipo da comum invenção
Segue em velocidade vertiginosa
Rumo ao futuro
É parte das partes que formam a peça
Do fruto pecaminoso
Que no centro instala a semente
Quando se abre no fio da navalha
O corpo
Dentada roda viva
Da origem dos homens

(imagem: Andrey belle)

Com...posição



O jogo de palavras que me alicia
Usa a ponta da língua como tabuleiro
Brinca entre erros e invenções
Na ausência de regras
Vence-me
A criação rasga o vazio de ideias
Rompe a pele do tambor
Dança com a ponta dos dedos
Em sensuais movimentos na nuca
E enche-se de vida
Possuindo-me na minha morte
A elegância da postura
Simples corpo nu exposto
Enquadra sem moldura
A volúpia do pensamento
O nexo ausente, aparentemente contradiz a lógica
Mas compõe a postura de opostos
Numa junção de tomadas de posições
Concretas
Claras
Distintas
Na atracção dos pólos
Sem objectivo claro
Apenas porque surge na hora
A magia do acto
Criação sem dono
Composição
Com postura de trem em marcha
Na linha invisível
Sem destino marcado
Nem bilhete de volta
Segue descontrolada…mente
Pare
Escute
Olhe
Passagem de (sem) nível e sem guarda…




Imagem: Mystery of shadows, photo manipulation by Natalia Naka Adamska

Dimensões subjectivas...


O tamanho das coisas está nos meus olhos pequeninos
Tem dias que é enorme o universo
E meus olhos enchem de luz e esperança
Outros há, que a pequenez do que vejo
Causa-me miopia por osmose
E de lentes, tento aumentar o impossível
Franzindo mais que as vistas
Como um pêssego passado
Sem o comer
Roendo o caroço
Restos nos quais o paladar se eterniza
Só para me entreter
E olho-me ao espelho insistentemente
Abrindo os olhos minúsculos ao reflexo
Fosse ele convexo
E teria muito mais que ver
Tem dias em que me lembro dos meus olhos grandes
Sendo eu pequenina
Outros há, que os fecho tentando não perder memoria
Do tamanho dos meus olhos antes de crescer…

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Com.fusão


Desastrada a coisa que a possuía
Mas em vez de chorar ela ria
Perdia-se nos pensamentos
Enleava cabelos no vento
E rodopiava sobre si todo o dia
Por vezes caia de exaustão
Falava em turbilhão
Em vez de andar, corria
Falava pelos cotovelos
Coleccionava ideais
Perdia-se nos sonhos
Alimentava-se de utopias
Nunca entenderia os demais
Vestia a camisa de forças
Em dias especiais
Sorria complacente à lógica social
Depois fazia todas as revoluções dos conceitos
Presa ao preconceito original
Sabendo ser possível o impossível que a fazia marginal
Sabia-se pilar de construção a demolir
Enfrentava o tempo
Comandava o vento
Era a confusão da fusão de um ser especial
E quando cansada..ela morria
De amor
Todos os dias
Em no meio da ressurreição
Surgia
Confusa, até se lembrar quem era…

Crime Calado


Crime calado
Cansam-me as palavras repetidas
No eco que fazem ao cair em mim
Necessitaria reinventar significados
Como forma de não me cansar de ouvir
Mas elas são redondos seixos de praia
Saltando pé ante pé mar adentro
Provando a existência do milagre…
Impossível matar palavras por afogamento
Nem que vos mateis a chorar sobre elas
Será em vão…
E decapitar palavras é tontice
Todas elas há muito que andam perdidas na lua
Ok, matar a catatua não seria a mesma coisa!
Pensei dar-lhes outro tratamento
Mata-las por falta de sustento…
À fome e sede sucumbiam
Mas que bebem as palavras?
Bebem o sangue das nossas veias
Em cocktails decorados com rodelas de limão
Em copos habilmente polvilhados de sal
E que comem as palavras?
Pensamentos acabados de pensar
Ou até as pequenas tenras e frágeis ideias a germinar
Comem também sentimentos
Mastigados ou roídos
Come-nos todos os sentidos
E é vê-las engordar
Que desilusão…
Matar assim as palavras seria a nossa condenação
E se as prendêssemos entretanto
Atadas ao canto
Na sala de espera?
Para não morrer de tédio
Falariam entre si
E alguma coisa me diz
Que a morte surgiria
Como quem decide morrer assim…
Suicídio em cadeia
Lenta e indolor
A palavra morre de amor…

E eu sem crime me puni