Com_traste

Com_traste

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

...

Não sabendo ao certo o poder das palavras.
Nem o nosso...quando falamos,escrevemos ou simplesmente calamos.
Elas, as que nos fazem diferentes
As que nos mascaram
Nos escondem
Nos revelam
Nos engrandecem ou nos tornam insignificantes
Elas
Nada são sem a nossa consciência, o nosso sentir
E se te calas..é a ti que falas
E se falas...é a ti que dizes
Mas o teu poder é o poder que ao outro dás
Por chorar ou por sorrir
Pelas palavras que lhes dás
Ou pelas que deixas de proferir
E depois...depois acima de tudo
Há os gestos...

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

So-rio

O rio
É um choro sem ondas
Que desagua sempre no peito
Nasce algures
Ora nuns olhos tristes
Ora nuns lábios sorridentes
Navegar nesse rio é navegar à deriva
Um arriscar
Uma loucura
Soubesse eu onde ficam as margens
E sem dúvidas
Me deixaria afundar~


Tempo-ral

Chove
E eu gosto
O vento traz som dos teus gritos
Os restos que deixamos pelo chão
É um revoltar de coisas mortas
Num rodopio
Parecem vivas as coisas
Neste mundo de marionetas
Uma força outra que não nossa
Um medo
Uma indefinição
E chove
Chove muito
E o vento parece abrir todas as portas
Talvez nos leve
E nós...com menos convicção
Da força que nunca possuímos


quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

NU aperto




Atada de pés e mãos
A memória agita-se
Sua a mente
Na aflição do futuro presente
Do prazer da dor por antecipação
Em dádiva consciente
Um risco com-sentido
Só opção
Quando do pé prá mão
O nó aperta e une
Duas partes terminais
Numa morte súbita
Da lembrança que se aproxima em passos largos
E o inesperado improviso do acto surge
Aperfeiçoando o perfeito
Acrescentando ao limite mais um ponto
Deixando o corpo em pêndulo
Como naco de carne em exposição
Onde a memória se acumula na pele arrepiada
Bastando a ponta dos dedos para uma leitura
Do futuro...incerto.

Bela adormecida



Era sono o que ela trazia nos olhos
E no olhar uma noite fria
Nos lábios, um nada guardado em eco
Silabas soltas em nós na garganta
Era cansaço que guardava na mão fechada
Raiva em punho
Esperança em gestos
Era saudade o adeus de despedida
Tarde o beijo
Hora certa de partida
Era insónia adormecida
Tantos anos
E ela nem fora parida
Nove luas
Nove meses
Nove anos fossem agora
Tanto conto sem desconto
Era uma vez
Ela outra vez
Agora
Assim
Ainda
Em equilibro
No fio sem prumo
Intermitente vontade
Ora morta
Ora viva
Era sono...quando fechava os olhos.
Sonhava-se

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Passo Doble

Passo a passo
Danças-me nos olhos negros
E na alva pegada numa areia movediça...afundas-te
E eu descalça
Fingindo-me ausente
Calço-te como uma luva
Para que do pé para a mão
Tudo em nós mude
E danço agora eu em olhos teus
E tu descalço me calces
Passo a passo
E eu me afunde.

Esquizofrénico




Deitava na madrugada do ventre
Aninhada num colo imaginário
Era totalmente inconsciente
Um choro em ladainha balançada
Enrolava um umbilical cordão no dedo mindinho
Fazendo e desfazendo a realidade
Sorria em desalinho
Num código maternalmente decifrável
Cresceu sempre ao pé coxinho
Gente ausente
Palpável
Via coisas inexistentes
Morria de medo de tudo
Vivia em cima de nada
Coração em batente
Num toc toc insistente
Até que a porta se abrisse num "quem é?" normalizado
E sem necessidade de apresentações fundiam-se etéreas mãos
Alucinações constantes faziam-lhe companhia
Ciumes como facas cortantes
Dores de parto num acto de ficar para sempre
E beijos marcados em pele de galinha
Cartas nunca lidas antes
Palavras escutadas em surdina
Relia a palma da mão nua
Numa linha imaginária desfiava contos sem fim
Chamavam-lhe amor e vivia aprisionado numa camisa branca
Sem gravata para dar o nó
Abraçava-se
Morrendo e vivendo sempre assim
Louco
Apenas louco
Parecia tão feliz!









Preto e cal

Ela contava que de noite os ratos lhe roíam as orelhas
E de dia tentava caça-los
Vestia de preto
Daquele preto limpo
E nunca tinha comido bananas
Não conheceu novelas
Nem sabia ler
Vivia num arco de pedras brancas caíadas
Uma gruta onde se viajava no tempo
Quer na gota de agua fresca do cântaro
Quer nos seus olhos fundos
Tia de uma avó já velhinha
Invertia a ordem das coisas desde cedo
Eras pele e osso
Franzina
Das velhas mais velhinhas que conheço
Dos pratos de loiça ratinha fez sua fortuna
Guardou na cómoda retalhos que foram vestes
Imagens que foram gente
Um filho que foi defunto
Do marido guardava mágoas sem choro
Sempre a conheci sozinha
A tia
Antónia
Minha



Quem?

Nós as pessoas
Quase pássaros
Quase amigos
Quase amantes
Nós as pessoas
Quase pensantes
Quase justos
Quase iguais
Nós as pessoas
Quase répteis
Quase vampiros
Quase animais
Nós as pessoas
Tão desiguais
Assim se mude a hora
Assim se aviste o pote
Assim se sinta o cheiro do poder ou dinheiro
Quase verdadeiros
Diabos
Vermes
Interesseiros
Quase somos reais
Mas quase quase



Da incrédula

Retiraram o rosto
Roubaram a postura
Copiaram os gestos
Violaram a pureza
Trituraram
Misturaram
E distribuíram pela pobreza
Esta
Farta de nada
Multiplicou a vergonha pela malvadeza
E aceita agora o facto
Num encolher de ombros resmungão
De ser clone da não crença
E procria ninhadas de nadas
Sem fé na força da credibilidade subjectiva
Que dá força e prova uma não existência
Capaz de injustificar um facto comprovado
E na contradição
Mudar o mundo
Mas
Da incrédula
Eles roubaram tudo.