Com_traste

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segunda-feira, 12 de julho de 2010

SEM CARTA DE RECOMENDAÇÃO NEM LIVRO DE RECLAMAÇÕES


Era noite,
talvez a noite mais escura de todas as noites.
A lua saíra à pressa parecendo adivinhar coisa ruim,
ela sabia que só os amantes sentiriam sua falta e esses inventariam um outro lugar para sonhar.
As estrelas, essas escondidas entre a escuridão, pareciam cintilar a medo, mal se viam propositadamente.
A rua silenciada pela hora tardia, aparentava cansaço, uso, desgaste.
Desejava a manhã para que passos apressados, correrias infantis e vagarosos caminhares, lhe devolvessem a imagem de rua com vida de verdade.
Uma ou outra voz soava a sussurrar, talvez contendo o grito de raiva ou o gemido de prazer, mas era tarde demais para vontades.
E restava o vento, a ir e vir assim pela noite escura, querendo arrancar as folhas que teimavam em se prender à vida, querendo calar o silêncio da noite num turbilhão de sons medonhos que só nos corações dos meninos pareciam ser ondas do mar, mas no dos homens vividos eram uivos.
E foi ai, nessa noite escura,
talvez a noite mais escura de todas as noites,
que nasceu a consciência de ti... existindo longe

À Deriva


Como barcos de vela recolhida
Antes que o vento nos leve para fora dos sonhos
Secamos a pele dos dias frios
Nos raios tímidos de um sol fora de tempo
E na chuva que não pára de cair
Inventamos um mar de ondas calmas
Para que no fim do dia as tardes aparentem ser de verão
E assim somos a tempestade no mar alto
E a calmaria das águas ao por do sol
Sempre que o leme teime em nos guiar para fora de nós
Deitamos ancora e ficamos assim por mais um tempo…
Ali, onde o rio já é quase mar…
E nós somos nós…quase.

domingo, 11 de julho de 2010

ANCORA-D-OURO


Cansada de navegar por mares já antes navegados
Repetem-se as paisagens idílicas de quem traz miragens nos olhos
Uma e outra vez afundamos
Uma e outra vez voltamos a navegar
Icem as velas
Agarrem o leme
Sem rumo vamos em frente
As vagas fustigam os corpos cansados
O sal e sol consomem a pele já quase sangue

As gaivotas já deixaram de voar há muito
Não há mais mar para lá do horizonte

Solto a âncora em terra de Ninguém
Ai é porto seguro

sábado, 10 de julho de 2010

Corpo Manuscrito


Molhei a pena com que escrevia a distância
Na saliva que restava do beijo em rodapé
Manuscrito em letra primária
Cuidadosamente desenhava a palavra amor.

Tão cuidadosamente quanto sentida

Molhava a pena que separava a vontade das asas
Nas lágrimas doces cozinhadas em lume brando
Num caldeirão de sonhos de menina
Lentamente soletrava o teu nome

Tão lentamente quanto o escrevia

Molhava a pena no suor do rosto
Depois de noites e noites sem adormecer o desejo
Chegava ao fim do poema inacabado
Deixando em branco todas as linhas do meu corpo.

Tão brancas quanto a pena com que escrevia

segunda-feira, 5 de julho de 2010

Procura-se, morta ou viva, a imaginação do meu criador.


.Fazer… Desfazendo

Posso ser até um monstro dos vossos pesadelos nocturnos
Um anjo dos vossos desejos de santidade e pureza
Façam-me Deusa
Ou diabo de saias
Façam-me um doce recheado do pecado que vos atormenta
A maçã já podre que Adão não quis morder (gajos!)
A Eva ,de parra em queda livre corando pudica..mente
Juntem as peças do puzzle, uma a uma,
Encaixem os pés na zona dos braços,
A cabeça fora do sitio
Percam a parte de um coração alado
Joguem ao ar os dados viciados e gritem loucos..batota!!
Inventem-me, refazendo a roleta russa onde quem morre é sempre o ultimo que dis(Z)...para.
Comandem à distância os membros do boneco articulado que sou
Qual marioneta tonta.. que diz que disse um outro qualquer
Pinóquio ou Gato das Botas
Cinderela e Branca de Neve
Contem-me nas estórias recontadas
Façam-me andar em roda cantada
Serei a fada, a bruxa a outra mal amada
O pecado cruel.
Mas por favor
Inventem-me sem ser Mulher
Deixem-me ser assexuada
Porque para tão mal imaginada ...prefiro ser diferente do meu criador.

Se não me sabem…inventem-me se faz favor!