Com_traste

Com_traste

quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Maria Flor


Tinha o cheiro das giestas mesmo sem ser primavera
Crescia livre sem mãos que a moldassem à terra
Tinha braços de abraçar um mundo
Tinha raízes como quem tem prisão
E ela crescia selvagem
Cabelos ao vento da cor da liberdade
Rosto trigueiro
Corpo franzino
Não fora ela uma simples mulher
E talvez fora outro o seu destino
Era rebelde
Queria todas as vidas numa só
Fazia guerra para ter pão
Fazia amor para ter vida
E vivia perdida na sua condição
Era o grito dos outros no seu grito
Era o silêncio dos infelizes na sua voz
Era tanto…tanto!
Acho que ela era todas nós
Mulheres
Flores
Mulheres espiga
Mulheres de dores
Amantes
Amigas
Pu.ta
Perdidas
Era todas, num arbusto enfeitado
Na beira do caminho, corpo abandonado
Ao vento, dançava
À chuva, cantava
E no sol ..teimava em lutar
Não sabia bem ao certo porque tinha o nome de Maria Flor
Mas sorria cada vez que o dizia
Se fosse diferente queria ser pássaro..um beija Flor
E de repente encheu-se de vontade de voar
E quem sabe… conseguir-se cumprir
Maria Pássaro Flor..num beijo
Partiu!

terça-feira, 30 de agosto de 2011

E Voo Lução



Levitava agora
Depois daquela hora em que morria nos seus braços
Era sempre assim…
O chão fugia à pressa, parecendo não aguentar tanta leveza
E ela apanhava a primeira nuvem
Que passava sempre a hora incerta, mas sempre a tempo de a levar
Com aquela cara de quem acredita em fadas e duendes
E sorrindo com aquele sorriso dos Deuses
Ficava assim a ser livre no ser
Sem nada que a segurasse à terra
Nem sempre podia voar nas nuvens
Nas patas da águias
Ou nos bicos das cegonhas
E essa impossibilidade, aliada ao facto de existir enquanto gente
Fizera dela tantas vezes a marginal
Por vezes a fuga eram os sonhos
Outras, o olhar perdido e vago no tempo, pela janela e no horizonte
Tantas vezes fora repreendida que desistira de se fazer entender
Fazia-se concha
Casulo
Chegava a sentir-se do tamanho das formigas
Mas encontravam-na sempre, fosse como fosse
Migalhinha…
Agora encontrara aquele lugar
Aquele onde voa sempre que queira
Onde se morre e ressuscita na mesma hora
O lugar onde se ergue aos céus e se sente como um anjo
Depois do voo em pique
Quando com ele se deita e se dá inteira
E ninguém a consegue fazer voltar à terra naquela hora
Nem as mais velhas tradições
Dos tempos em que os repteis se ergueram
Nem as santas virtudes das senhoras das procissões
Com o pecado afogado no peito
Nem as leis da física
Que fazem cair as maçãs das arvores
Ou a gravidade
Seja de facto ou fato
Dependendo da ocasião
Ela agora dominava a razão
E se decidia voar
Voava
E ninguém mais poderia negar os sexo dos anjos
Ou chamar-lhe tola
Ser livre é ser-se dona das suas asas
E só pousar quando o coração lhe pedir para adormecer um pouco
Ou ela precisar de descansar da solidão…

Dizem que é a ultima a morrer...


Ela pintava sorrisos
Andava de terra em terra e onde chegasse e encontrasse um largo
Daqueles com igreja e em que os sinos marcam as horas do dia
Estendia o pano cru, de cor de terra já mais que batida e suada
E na primeira hora entretinha-se a espalhar as latas de tinta
Os pincéis, espátulas, rolos , paus, giz, lápis de cera e outros tantos utensílios que só ela sabia o uso
Quando os dias eram quentes, daqueles mesmo abrasadores…
A sombra de qualquer arvore era o lugar escolhido
Em caso de dias cinzentos e frios
Era num alpendre velho, ou vão de escada de uma casa abandona, que se abrigava
Nunca sabia ao certo o tempo que estaria ali…quase tudo era improvisado a sua vida
Sem eira nem beira
Sem morada ou caixa postal
Era ambulante..errante por destino e opção
Fazia laços com facilidade, mas nunca se lembrara de ficar mais tempo, que o tempo de fazer laços..em que lugar fosse …
Para ela a estrada era como uma fita de cetim colorida
Que estendia juntando gentes e lugares
Enlaçando aqui
Atando acolá
Caso quisesse, poderia sempre voltar atrás e teria assinalado o caminho de volta, pela cor e luz do tecido que o cobriam
Reconheceria sempre a terra que já a brigara
Os laços que já fizera…
Mas naquele dia não chovia , junto à igreja erguia-se uma oliveira de um tamanho anormal
Ninguém se lembra há quanto tempo deixara de dar azeitonas..crescia a olhos vistos e a sombra que fazia era tão grande..mas tão grande..que em tempos de muito calor dizem que o pastor, que tinha o maior rebanho da aldeia, era nela que passava as tardes longas e calmas ..com todas as suas ovelhas. O cenário fazia arrepiar o Prior…que invejava tal rebanho…adormecido.
Mas isto tudo para dizer que foi ali que ela resolveu deitar o seu pano e espalhar as suas tintas…
E enquanto estava..pintava.
Pintava sorrisos nas arvores
Nos sinos
Nos rostos dos meninos
Nas vendedeiras da rua
Nas pedras das calçadas
Nas janelas
Nas lapelas dos senhores bem vestidos
Pintava sorrisos nas nuvens
Nas terras ressequidas e abandonadas
Nas maçãs
Nas vinhas
No senhor prior
Na santa do andor
Nos lugares escondidos
Nos becos dos sem abrigo
No cão rafeiro
No padeiro
Na senhora de má vida
Nas manas solteironas
No vendedor de carvão
Pintou sorrisos no pão
E há que diga que se multiplicou
Pintou sorrisos nas noites
Nos dias
E no mês que corria
Na cara séria do homem do talho
No sacristão
No bêbado
Nas beatas
E nas virgens
E enquanto pintava e não se cansava…a aldeia mudava
Não sei se por gosto ou espanto
Toda a gente sorria
Todas as coisas sorriam…
E ela…voltou a partir pintando a estrada que a levava além…
Ninguém se lembra da ter visto
Ninguém sabe o que se passou
Hoje, há ainda que conte que houve um dia que a oliveira secou …a sorrir…mas há quem ainda tenha esperança, que para o ano ela volte a dar azeitonas.

(histórias para quem não pensa que é gente grande!)

Rua do Imaginário


Os dias eram longas tardes anoitecidas
Os relógios nada mais marcavam que o tempo que faltava…para qualquer coisa acontecer
Uma ampulheta cheia de pólen, era virada a cada espirrar alérgico
A musica era um som cadenciado dos passos da multidão
Fazendo dos silêncios da solidão, a pauta com linhas do destino
A possibilidade de tudo fazia-se horizonte
E o por do sol era sempre da cor dos olhos apaixonados
As casas, eram blocos de jogos de encaixe
Que ninguém forçava encaixar
As arvores, eram abrigo de pássaros e dos homens
Dando sombra, dando frutos, dando vida e cresciam, cresciam, cresciam…como escadas para as nuvens
Os animais, eram sorridentes como nos desenhos animados
As crianças comiam gelados de mil cores, em taças de cristal
E os adultos nunca faziam birras
Quando chovia, os lagos enchiam-se de esperança e os peixes ficavam todos verdes
Quando não chovia…os lagos enchiam de esperança e os peixes pensando que estava a chover… ficavam verdes…
Das janelas das casas avistava-se o mundo inteiro
E as portas só serviam para entrar
Dos telhados soltavam-se buganvílias lilases
Fazendo pontes entre as casas e as nuvens
As pedras da calçada eram daquelas com história
Fizeram fogo
Fizeram-se roda
E nunca, nunca choravam
De noite, todas as estrelas se juntava nas esquinas
E a lua cantava serenatas ao sol
Quando alguém se perdia..era naquela rua que se encontrava sempre
E conta quem viu…que era mesmo verdade!!

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Um café e dois dedos de conversa....


Qualquer coisa se passa no tempo que não passa e não melhora
Se faz sol..é quente e queima
Se faz frio…os ossos doem como se fossem partir ao mais pequeno movimento
E depois o vento…
O vento que me despenteia e leva com ele o que sobra pelo chão
Os trapos, as folhas, as palavras…todos os gestos que ficaram por fazer
Os momento em que se roda a colher na chávena de café quente
É longo…é eterno
E o açúcar sem se dissolver aos meus olhos
Aquele lago castanho em remoinho, hipnotiza-me
E o cheiro de outras terras ..outros lugares, entra-me pelo corpo adentro
E mexo…para que se entranhe em mim
Mas arrefece
E com o frio passa o cheiro do lado de lá da margem
Já não me apetece leva-lo à boca
Perde o sentido agora
Perco a miragem
Perco a vontade
O tempo lá fora continua quente!
Disse a senhora de olhos verdes, cabelo de um loiro “desnatural,” corpo de idade incerta
Olho-a e sorrimos as duas
Ambos com a convicção de que o tempo é nosso aliado nas horas vagas
Sorrisos desses cúmplices, matreiros…quase diria que são sorrisos de piscar de olho…
Talvez ela tenha a minha idade..talvez!
Sem lhe pedir traz-me outro café…bem quente, diz ela ao mesmo tempo que a sorrir retira a chávena de café que jaz frio…
Tenta-me, penso.
Naquele momento resisto a ceder à confirmação dos seus pensamentos sobre mim…levanto-me, pago os dois cafés e digo… até amanhã!
Qualquer coisa se passa com tempo…ou…com o tempo, passa-se qualquer coisa…já nem sei!
Caminho até à esplanada da frente…a sombras das arvores refrescam o espaço ocupado pelas mesas, sento-me, olho o empregado…novo, de estatura mediana, cabelos lisos e negros de um tamanho exagerado mas disfarçado com o elástico que o aperta…aproxima-se, diz boa tarde e eu olho-o…um café bem quente se faz favor, peço!
Com adoçante? Pergunta-me.
Com açúcar!! Respondo de forma firme e orgulhosa…aposto que devo ser das poucas a pedir com açúcar, penso.
Traz-me o café…
Repito os movimentos lentos do abrir o pacote de açúcar..vejo-o entrar na chávena e desaparecer..mexo e apresso-me a leva-lo à boca antes que arrefeça.
Está abafado hoje, digo.
Mas não obtive resposta…
Olho a chávena vazia…e vou embora sem dizer até amanhã!

Acto único



DuElo de corpos nus, num delito de deleite, sem provas que nos identifiquem como inocentes, cumprimos a pena suspensa na palavra, nos corpos,na cama e no chão.

Depois morreram felizes para sempre!

Reflexos... controversos


Por vezes calo-me
E nesse silêncio, a audição do que penso acontece de forma mais clara
Verbalizo então o resultado daquele raciocínio
E faz-se luz na consciência do que realmente sou
Como sombra ilumina naquela hora
Sai à pressa porta fora
E em ausência se faz, por não querer quebrar cristais
Mas ouve-se o som da fractura
E sangram os rostos em contorcidas expressões
Na junção dos mundos paralelos
Acontece o ponto de encontro quotidiano
Por hábitos quase sagrados
Os sorrisos SOS
Os cumprimentos deslavados
Entre a bica e o cigarro
Existem todas as outras horas
Por vezes o deixar de fumar seria a solução para a aceitação
Não fosse quase impossível deixar o vicio…de mim mesma
E aquela mesa seria apenas minha, entre café e café
Seria ousadia olhar a outro espelho e ver o mesmo reflexo
Mas não deixo de ver reflectido o que também sei ser
Mas é algo controverso
Este ser e já não ser
E saber ilegíveis os meus poemas
Escritos entre realidades paralelas
Com letra manuscrita de tinta pouco permanente
Na mesa do centro, no café central do meu mundo umbilical
Nada mais que eu mesma gira em seu redor
Em espiral ,como agua a ir-se pelo cano, depois de um banho de aguas turvas
Restando umas pequenas gotas a escorrer pelas minhas paredes
Em regos, marcado os dias em que nada se diz, por já não ser possível
E nessa insistência se existe quase todos os dias…i
Incrivelmente desiguais e semelhantes a todos os outros.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Metamorfose


Depois do dilúvio das palavras
Fez-se barca
Casulo sem fios de seda
Feito de baba enraivecida
De bílis
Azeda
Onde se deitou adormecida
Sem contos de fadas para contar
Pele seca escamosa
Criatura monstruosa
Desigual
Iria dormir cem anos
Ou talvez nem acordar
Fazer-se gente
Calar para ser decente
Sorrir
Rir
Encantar
Não teve o dom das palavras doces
Nem a beleza sedutora dos gestos bem cuidados
Não tinha rosas no cabelo
Nem vestido de laços delicados
Atravessava a rua sem olhar
Jogava ao pião
Chamavam-lhe furacão
Agia sem muito pensar
Depois afogava-se nas palavras
Sentires na flor da pele em turbilhão
E chorava e ria na mesma hora
Caia
Morria de exaustão
Desta vez babou a raiva
Nesses fios de bílis endurecidos
Teceu com fúria
Envolta nas sombras de quem a forma
Seria a sua ultima condenação
Prisão perpetua
Aquela que não entendem
E das palavras que julgava compreensão
Fez o escudo para sua protecção
Consciente do seu fel
Mas não sendo cruel
Esperaria a hora da transformação
Até que morresse depois num bater de asas…momentâneo
E sentir a leveza da sua própria ausência
Livre de si sendo apenas ela
Não o outro que se transforma em nós
Por defeito da mutação que nunca soube completar
Como bicho estranho
Que finda, entrando no seu próprio ventre
Para se auto fecundar
Talvez um dia parir-se noutra vida
E não precisar de morrer para ressuscitar










quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Era uma vez..


O livro jaz vazio, como se não soubesse da obrigatoriedade de se morrer cheio…mesmo que de nadas fosse.
Algures a morte anunciada no jornal local, fazia saber aos mais distraídos, da possibilidade de mortes impossíveis.
Uns falaram de suicídio do escritor, ainda novo, não aguentara a pressão dos críticos e antes que dele falassem, matara-se.
Outros, desmentiam o facto, dizendo ter sido suicídio social…há muito que era do conhecimento geral a impossibilidade de se viver à margem, como clandestino, ousando ser diferente, inventando histórias, criando factos, vivendo assumidamente…vivendo.
Outros ainda afirmavam saber de uma investigação policial, assegurando existirem testemunhas do crime…o escritor fora morto pela sua própria imaginação, um personagem cometera o crime por não aceitar ser ele a vitima.
O governo fez sair um comunicado de imprensa, informava do acto de Eutanásia… afirmavam existir a vontade expressa da vitima, escrita num guardanapo de papel (onde se viam marcas de lábios ainda, supostamente femininos), e que o autor de tal vontade seria julgado logo que fosse possível saber o seu paradeiro.
E o livro continuava ali..morto e vazio, não se sabe se mais vazio ou mais morto…numa espera de algo único e especial.
Se alguém tivesse duvidas da sua existência, enquanto possibilidade de ser, poderia verificar a dureza da capa, a suavidade e brancuras das páginas..o peso, mesmo que vazio..o peso que ainda assim possuía…
Algo assim, só poderia ser algo real…
E por vezes morre-se antes de se ser todas as possibilidades…
E como pesa essa possibilidade do ser!
Mas há sempre quem leia o livro branco e consiga decifrar nas linhas vazias, a silhueta da história. Rindo, chorando, admirando-se, ficando ansioso e passando as páginas ao ritmo da sua criatividade e imaginação.
Por vezes lê a ausência de uma “assentada, não importando a posição em que o faz. Outras há em que deixa o marcador naquela página, dias e dias, apenas voltando a ela quando o tempo para nada fazer lhe permite esse luxo.
Estes livros são histórias intermináveis, não importando seguir a ordem das páginas, podendo começar pelo fim…mas acabam sempre quando já não mais nos apetece ler….ou matamos o personagem principal, capturando o criminoso que condenamos à prisão perpetua (nunca a pena de morte é usada, embora seja legal neste estado…de alma) ou a história é de amor, e o fim é daqueles em que a ultima página terá marcas de agua salgada…e ondas de corpos naquele leito.

Crónicas Marcianas


Tem dias em que
O mundo está cheio de coisas perfeitas
E de gente cega
Outros
O mundo está cheio de coisas imperfeitas
E de gente cega
Moral da história

Nem tudo tem dias!

Matrioshka


Eu sou um todo de partes que desconheço
Encaixo-me em mim como se me pertencesse
Ajeitando-me às formas que me formam
Faço-me uma, irreal
Outras, uma outra imaginária
Ainda por vezes a invisível
E tantas, tantas outras, a porca de pérolas ao peito
A cabra
A raiva
O sal
Se trinco a língua, mordo todas as palavras do momento
Serei a cobra e o veneno
Dos factos
Do parto
O sangue verdadeiro
E não me obriguem a morder o ar
Prefiro antes ser cega, surda e muda
Que trincar apenas o nada que acontece
Morder a consciência com asas
Lamber o mel dos vossos sorrisos
Quando me ferem de morte
Enraivecida
Mas não minto
Terei sempre a certeza que nem todos os erros são meus
E na cova que me deitam
Guardarei todas as outras
Cá dentro
E sei que quem as conhece
Sabe o jeito de as manter vivas
Na única delas que me forma
Multiplicando-me na divisão
Unindo-me na separação
E se ficar oca…sinto!

Parvoíces! (apeteceu e pronto!)


Contam
Que um dia um Homem foi à pesca e caçou um Homem
Sim, naquele tempo ele dividia-se entre a pesca e a caça
Mas foi na pesca que caçou um Homem
Ou o Homem deixou-se caçar, sei lá
A questão está em que nessa altura não havia épocas
Quer dizer, havia épocas, mas elas ainda não tinham sido marcadas por quem de direito
E esse facto dava a ilusão da sua não existência, e os Homens eram livres de pescar e caçar todo o tempo
Ou todo o tempo em que a sua vontade e fome lhes apertasse
Pescando aquilo que picasse
Caçando aquilo que aparecesse
Nessa altura ainda o desporto também não tinha sido inventado
E praticava-se sem ter consciência
Talvez por isso os corpos depois se desenvolveram de uma forma tão bela…
Ora bem..
O Homem que foi caçado quando um outro Homem foi à pesca
Não era presa fácil
Lutou com quantas forças tinhas e até com a fraqueza também
De nada lhe valeu
Houvessem nessa altura as “reservas” e acredito que o Homem teria tido alguma sorte
Alegando estar ali por engano
Ou até defender-se por ser fora de época
Mas não..nada disso surgiu em tempo útil
Talvez porque o poder nessa altura não era assim tão útil, e as terras, os animais e as coisas eram naturalmente usadas
Mas a natureza humana é esta, e caça e pesca desde que começou a meter na cabeça aquela coisa da evolução, deixando para trás a ideia de um Deus qualquer, que de certeza nunca teria dado ordens nesse sentido
Esta desobediência humana, baseada na ideia da sua natureza, foi a única causadora deste facto
Mas um Homem que é Homem, quando por desgraça é caçado, mesmo quando um outro anda apenas à pesca, não se entrega assim à desgraça, dá luta..se necessário usa de armas ilegais até, outras vezes utiliza a sua maior arma e se tiver sorte…dá a volta ao Homem pescador inventando quiçá uma anedota qualquer sobre os mentirosos..
Consta que foi desde essa altura que o Homem caçado passou a ser utilizado como engodo…
E ainda hoje, o Homem que caça outro Homem, lança a linha com o mesmo isco…sem “reservas” ou épocas estabelecidas..
Uma e outra vez…até que haja a verdadeira Revolução e os animais voltem a falar como antes.

Bichinhos...


Quando te sorriem os olhos
No branco nu do lençol de linho
Vês a fera que se lança sobre ti
Afiando as garras nos dentes
Instintivamente ris
Nervoso
De medo
Do gozo
Que te dá o acto
De te deixares possuir por ela
E serenas o instinto selvagem
Para que se invertam as sensações
E no branco nu do lençol de linho
Aninhas-te na espera
Presa condenada
À morte nas garras da fera alimentada por ti.

Meninos mimados!


Os beijos
Aqueles beijos em que as bocas ficam entre a vontade e a espera
Entreabertas à possibilidade de tudo
Na ânsia
Inquietação
Desassossego
E o tempo é apenas o gesto rude do puxar de rosto
A mão a segurar forte os cabelos
E um, queres não queres?
E no, ainda Não, as palavras enrolam as línguas em impropérios
São beijos em que a vontade é a própria contradição
E os corpos divagam na palavra beijo
Sem que nenhum dos dois beijasse
São beijos mal educados
Desobedientes
E caprichosos
Que fazer?

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

Gosto(s)


Sabes a mel
A menta
Sabes a palavras com pimenta
Sal na pele
Sílabas adocicadas
Sexo em calda caramelizada
Movimentos circulares
Cereja na ponta da língua
Mãos quentes
Beijos ardentes
Gritos picantes
Provo-te
Bebes-me
Mordo-te
E ardes-me na boca docemente

Morte súbita


Morte pouco súbita a minha
No teu leito
Meu corpo desfalece
Quando me amas
E tiras-me o respirar
Prolongas a apneia
Entras-me pelas veias e tomas-me o coração
Deitas-me no chão
Sugas-me a vida
Apertas-me até que doa
Fazes do meu corpo morto
A prova da ressurreição
Tomas-me os pulsos
ComProvas-me viva
Bebes de mim tudo o que verto
E dás-me gota a gota
O liquido para que me possa reencarnar
Olhas-me nos olhos
Tapas-me os gritos
E sabes que minto se digo não quero mais
Viras-me
Dás-me o ultimo golpe
E minha alma em galope
Querendo sair de mim
Antes do fim avisas
Queres-me a vida
E eu rendida
Deixo-me matar por ti

"Lo único que me duele de morir, es que no sea de amor".
(El amor en los tiempos del cólera) - Gabriel Garcia Marques

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Negra


Morrem as Rosas do jardim que inventaste
E todas as outras vestem-se de negro
E eu…amo a cor dos teus olhos
Como amo a cor da Rosa
Lambo a gota que surge na ponta do dedo
Depois de te tocar os espinhos
Deixando nos lábios a cor rubra dos teus beijos
E eu nua
Prendo a Rosa negra nos cabelos
E deito-me sobre ti para sempre

domingo, 7 de agosto de 2011

Yin Yang


O teu corpo
É como um lago dos desejos onde me deito
É a morte do meu corpo como o conheço
É o reencarnar em mim uma outra
Sem pejo
És o esconderijo dos meus olhos
Do meu ventre ensanguentado
Guardas a prova da existência do ladrão
Dás-lhe guarida, vinho e pão
O teu corpo
É todo como os meus sonhos
As curvas perigosas que faço de olhos fechados
É a circulação ao contrário
É a rotunda dos sorrisos
A sinalética em gemidos
O teu corpo
É a toca do lobo
A casa na arvore
O refugio privado do amor
O teu corpo
É a palavra que procuro
O silencio que sou
O amor que me espera
O teu corpo
É as asas do meu
Que me ergue em voos
Cada vez que em ti me deito
E morres e renascem em mim
Como se tivesse sido sempre assim
O teu corpo…e o meu.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

E se perguntarem Quem és?


Não era certa ou errada
Nem branca nem preta
Nem grande nem pequena
Nem sim nem não
Era aquela coisa que fica com o nome de incerteza
Aquela cara de indefinição
Assim era ela
O seu corpo
A sua vida
Ficar assim num talvez
Numa possibilidade de se ser feliz e infeliz
No meio do caminho, à mesma distância do inicio e do fim
Não era o longe nem o perto
Nem o agora ou o depois
Nem bonita nem feia
Nem o ir nem o ficar
Era …
Aquela coisa que fica entre o abrir e o fechar
Não sendo mar
Não sendo terra
Não sendo o ar
Não sendo fogo
Era ela
A única certeza que tinha
Apenas ela
Só ela
Nem a outra nem aquela
E aquele vento morno, nem frio nem quente
Que lhe enrolava os cabelos
À deriva dos pensamentos incertos das coisas
Dos outros
Da vida
Ela não era Maria
Não era Ana
Não era nova nem velha
Ela
Ela era a que se chama
Prenuncio….de alguma coisa…ou boa..ou má
Quando se cumprir
A não ser que ….fosse engano!

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Já Vou!!!!!!!


Não sei que horas são
Deve ser tarde pois anoiteceu há muito
E lá fora já nem ladram os cães
Mas o sono, suposto chegar a horas certas, tarda
Talvez por isso seja tarde
Quando as coisas tardam é porque é tarde!
Neste vazio de sons e de luz
Tudo se torna tão audível e claro na minha mente
Nem sei se sou eu…serei tu?
Mas a descoberta da hora tardia das coisas, deixou-me alegremente confusa
Adoro esta sensação de romper com as regras
Todas as regras…até as físicas, biológicas, sociais, matemáticas…todinhas!!
A física obrigatória, quer que os meus olhos se fechem num gesto lânguido
E o corpo deixe de se agitar em frenesim
E até a respiração…que eu saiba também ela é obrigatória nesta vida!!
Até ela obrigam a modificar
Talvez por isso tenha apneia
Sempre fui do contra!
O corpo nega-se a agir com a mesma habilidade…mas o pensamento fá-lo por vezes contorce-se de formas nunca antes imaginadas
Os outros…dormem, de forma ordenada, certinha, um ou outro ressona, mas é perdoado pela forma como nega o facto todos os dias.
As horas que marca o relógio digital….adapto-as à minha regra matemática, em que na ponta dos dedos, somo as vezes que deixo a minha impressão na pele escrita.
As outras…sim, todas as outras regras..até as mais femininas e chatas..dolorosas parteiras…eu contrario….sangrando nas veias o mesmo sangue que me faz dar vida aos dias…
Mas este silencio de quando é tarde fascina-me
A ausência do que é normal nas coisas, nas pessoas, nos sítios, nos animais, é algo de rara beleza…é como se um Deus qualquer tivesse feito desaparecer tudo…e o mundo ainda pudesse, amanhã de manhã, ser um outro mundo…inventado por mim durante a noite.
Sorrio sadicamente, imaginando Adão sem parra no paraíso.
A Eva? Nascera primeiro e deveria estar ocupada a governar o inferno…
Volto a sorrir
Recuso-me a olhar as horas…
Mas neste silêncio consigo ouvir o galo
E o relógio da torre da igreja…

Que olhos trazes hoje?


A manhã acordara nos seus olhos
Lacrimejando gostas de orvalho
Era Agosto e ela sabia ser passageira aquela sensação
Nos lábios, o sol esgueirava-se das nuvens
Abrindo um ligeiro sorriso
Vestira-se à pressa por ser sempre assim o seu tempo…corrido
Mas não se esquecera de vestir o dia com as cores que ela mais gostava
O negro, a ausência do arco-íris que apenas trazia em certos dias nos seus olhos
Lembra-se de lhe terem dito que a morte vestiria sempre a cor que trazemos nesse encontro
E pensara que também ela poderia vestir os dias a seu jeito
A imagem de uma morte colorida era algo assustador
Queria-a com o negro que a pintaram
Não a reconheceria se assim não fosse
Na rua, todos os mortos vivos deambulavam
Um cão ou outro ladrava à sua passagem
Nunca gostara de cães que não entendessem o silêncio
Sabia-os capazes de a reconhecerem só pelo andar e pelos gestos
Nesta distinção separava os possíveis animais de estimação dos abandonados à sua sorte
Os gatos, sempre foram muito mais inteligentes
Em fuga sempre que a sentiam aproximar
E talvez por isso, criaram a fama de ter vidas que nunca mais acabavam
De que cor será a eternidade?
Pensa em investigar, pois é arriscado coincidirem nos gostos do guarda roupa
Lembrara-se da sua avó, sorria…sempre a lembrava de um negro eterno
E o dia aconteceu com toda a normalidade das coisas invisíveis
Fazendo jus à história do rei vai Nú, ninguém ousaria perguntar as horas
Nem se lembrara de alguém ter perguntado, então que tal, tudo bem?
Não sabia ao certo como conseguia, mas essa sua capacidade de apagar os dias era um segredo que guardava…
Mais tarde, a noite adormeceu nos seus olhos
A lua escondia-se nas nuvens, deixando um suspiro de saudade nos seus lábios
Vestira a cor com que fazia todas as noites acontecerem…e adormecia com a certeza que amanhã pode nunca acontecer da mesma cor…
Os sonhos, eram aguarelas coloridas…e nunca se lembra de alguma vez ter perguntado a cor da morte enquanto os pintava.

Sina


Cumpra-se!
O destino por ti decidido
Quando te inclinas para lá do oposto de quem és
Cumpra-se!
Opção obrigatória dos traços da mão
Quando desenham frases sedutoras
Códigos de linhas imaginárias num aceno à distância
Cumpra-se!
A imagem da tua mente em bola de cristal reflectida
Que cogita princípios do que ainda vai existir
Cumpra-se!
O jogo do jogar dos búzios
Que rolam com o imanes dos teus olhos
Cumpra-se!
O que as cartas escrevem noutra cama
Cumpra-se!
Eu resolvi acreditar na sina
Ser cigana sem terra nem paradeiro
E ler apenas aquilo que eu própria escrevo na minha mão..
E o destino será cumprido à risca!