Com_traste

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terça-feira, 24 de agosto de 2010

MATA Borrão


Precisava de mudar
Voltar atrás, fazer de novo.
Lembrava-se de como antigamente, nos bancos da escola em que vestia bibe e usava tranças com dois laçarotes na ponta, podia escrever cem vezes a palavra certa e quase de certezinha que não voltaria a errar.
Agora Sorria, por saber que era mais o peso do castigo, em forma de bruxa má e com uma mão bem pesada, do que o próprio acto de repetir correctamente, que a faziam lembrar que - Não era assim!!
Ou de como podia sempre sujar o vestido novo, ou partir a jarra antiquíssima da mãe, e com aquele olhar de menina assustada, disfarçando a maldade, dizia : foi sem querer!
Mas e agora?
De que vale escrever correctamente as palavras se depois, talvez por não haver outro castigo senão a própria consciência, haveria sempre uma próxima vez em que voltava a errar?
E tendo a noção do erro, erra vezes sem conta!
E se usasse corrector, assim como fazer de novo ou passar por cima?
Rasurava mas ficava sempre a marca, fingia que não doía mas era com tanta força que riscava por cima do erro que por vezes era inevitável o rasgar da pele.
Já usara lápis de carvão, embora fosse mais fácil de apagar deixava sempre a marca cinzenta..assim como sombra a pairar no ar, para que não se esquecesse de que mais uma vez voltara a cair na asneira de agir sem pensar.
Depois lembrou-se de como as cores davam um certo ar de festa a tudo o que fazia e passou a colorir com elas todos os seus dias. Pintou com lápis de cera, guache e aguarelas e fazia do destino uma tela, obra de arte diria, não fosse a técnica de dar ao erro uma outra cor muitos diriam que era um grande pintor! Fazia de qualquer pequeno erro ou da maior asneira , uma flor, um arco-íris, uma árvore, um pássaro ou até um castelo de nuvens… só ela sabia que antes a flor tinha sido um pequeno amor que ficará a meio caminho, ou que o arco-íris começara de uma dor daquelas que só a gente pensa que sente. Mas pintava e sorria, até que um belo dia achou que bastava de disfarçar e resolveu mudar .
Pegou na caneta de tinta permanente e com ar de gente inteligente, começou a escrever com todo o primor. Desenhava as letras como quem fazia sonhos, filhós de mel ou algodão doce, com tanto cuidado e lentidão, não lhe fosse fugir a mão ou algum outro horror…mas em cada hora nada mais surgia do que a primeira linha da sua história. Mal colocava o ponto redondinho com todo jeitinho no fim da linha simplesmente adormecia, e ficava assim como quem cai não cai…na folha pautada como uma princesa encantada.
Ao acordar sentia-se mal, pensou ser vertigens, doença rara ou até simples falta de vista, mas depois de olhar para o lindo ponto final, descobria que o seu mal era querer evitar errar e começava a matutar numa outra forma de poder escrever sem doer ao remediar.
Desta vez foi mesmo com pincel e sem se lembrar do papel, pintou o tecto, o chão, o cabelo, o nariz e as mãos. Estava tão entretida a pintar a própria vida, que nem reparou no boião de tinta que deixara ali pelo chão. Num gesto mais entusiasmado, deu um pontapé no coitado que este, mesmo sem gostar de se derramar sem ser para pintar e ficar, caiu de repelão no umbigo da criatura e assim como se fosse uma loucura, ela sem saber bem porquê, pensou:
- será que posso usar Mata Borrão?

(deve ter continuação…sei lá!!)

1 comentário:

  1. Mata Borrão?
    Nem pensar. Iria borrar a pintura.
    (também acho que deve ter continuação, mas já li o post seguinte e não era sério deixar aqui um palpite...)

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